Amor acostumado
Pensei muito em você durante o dia. Não por ser uma novidade, já não é mais. Mas, por ser um fato pelo qual eu jamais vou me acostumar, sabe como? Porque na maioria das vezes a gente se acostuma – como naquele poema da Marina Colasanti – a gente se acostuma, mas, não deveria.
A gente se acostuma com a mesma mão todos os dias. Com o mesmo beijo. Com a mesma companhia. A gente se acostuma com a mesma voz, o mesmo cheiro. A gente acha que já fez o bastante e o prêmio é estar ali. Mal sabemos que, na verdade, os Deuses dos amores e dos atores não acham nada disso o suficiente. Porque amor é manutenção. Amor é nutrir algo que, tadinho, caso não observado com muita atenção, vai morrendo. Ninguém chega em um estágio onde não precisa mais nutrir o amor. Todos os dias, é necessário um ato de amor. É isso. Sou defensora assumida dos atos de amor diários. Um beijinho inesperado e roubado. Uma flor que colheu da rua. Uma fugidinha da rotina com aquele jantar legal. Sempre acompanhados de um olhar apaixonado, como o da primeira vez.
Há que se tomar cuidado e observar. O amor desnutrido já não liga para nada. Não quer saber a diferença entre cabelo comprido ou curto, unha vermelha ou azul. É o amor acostumado. Os titulares são aqueles que têm a certeza de que já conquistaram o amor e agora ele é autossuficiente. Que o que basta é um "eu te amo" decorado por dia. O amor desnutrido não se importa com a roupa que você usa ou com o cheiro do creme novo que você comprou para usar no corpo. Não consegue reparar na calcinha nova ou já não liga mais para a marca de batom no colarinho. Maldito amor acostumado. Ele logo pega as malas e vai embora, é só aparecer alguma novidade. O corpo e a alma gostam disso – sensações de novidades.
Por isso, meu amigo, não se engane. O papo é atos de amor diários. É a flor arrancada. O poema escrito na folha de rascunho do escritório e guardado no bolso. O beijo roubado e inesperado. O jantar diferente.
Um brinde às novidades eternas.