Anota aí, Corona.

Aqui é vida real. Sem 3 chances – o game over é um só. Tem sol que nasce e se põe todos os dias. Todos os dias a possibilidade de ser melhor que ontem, entre tantos erros e acertos. E é sem VAR para dizer quem está certo ou errado. A gente continua jogando, sentindo aquela coxa puxando, sem ter a certeza do árbitro. 
Maritza e sua filha não poderão ver outro sol se pôr e nem imaginaram o que seria a quarentena por Covid-19. Matheusa não pôde ver Parasita e, muito menos, imaginar uma produção não americana ganhando o Oscar de melhor filme. Tatiane Spitzner não fará mais audiências e nem verá o Brasil ser hexa. A vida passa em um piscar de olhos. Muitas vezes, injustamente. 
Estamos todos em quarentena, isolados em nossas casas e, é sem querer romantizar o mal que o vírus está causando, que digo que estamos nos conectando – ainda que compulsoriamente – àquilo que importa. Pausamos. Colocamos nossos carros nas garagens e tiramos livros empoeirados das prateleiras. Agora, planejamos o jantar de hoje como se fosse um grande evento. Conversamos e expomos o que pensamos sobre X, Y e Z, no sofá da sala. 
E é olhando para o lado que peço: vai com calma, Corona. Meu pai ainda precisa ver minha filha jogando bola no quintal, com a camisa do Corinthians. Minha mãe ainda vai costurar mais 300 roupas. As crianças da Vila Torres ainda vão prosperar. O mundo ainda vai parar de ter esse cenário tão desigual. O capitalismo vai bater mais de leve. Anota aí, Corona. Eu ainda vou me casar e decidir se quero ter mais filhos. A Ana Maria vai se curar do câncer maldito. E, falando em câncer, a cura efetiva para ele vai aparecer. É sério. Você pode deixar o mundo em paz. Essa guerra sanitária, dolorida e sem precedentes (para a nossa geração) tem em cada morte uma dor de família, um filme acabado na metade. Um amor chorando no corredor de um hospital lotado. 
2020, por quê? Me fale de você. Você está sozinho? Quer almoçar comigo? Ver um filme? Escrever um roteiro novo? Me dar a mão e falar que vai ficar tudo bem? Meu nome é Caroline e eu vejo o bright side das coisas. Só que agora, não está tendo como. Estou com aquele medo que nem o Frontal ajuda. Freud e Sartre já não me dão tantas respostas e os livros estão me gerando ansiedade. Preciso de um abraço. Preciso chegar na sabedoria do 8º chope. Preciso daquele pilequinho que a segunda taça de vinho nos traz, sabe? Preciso de tudo isso misturado e um sofá bem grande nessa quarentena. Preciso pensar e não pensar. Preciso planejar, nessa angústia de não saber quando tudo volta ao normal. Me dê sua mão, 2020. Vamos escrever um novo roteiro. Por mim. Por nós. Pelo amor chorando no corredor do hospital lotado.