Eu e o Gin

Nós éramos todos aqueles filmes que você colocava para assistirmos tarde da noite e eu dormia sempre – e mesmo assim, meu amor, aqueles filmes foram os melhores filmes de toda a minha vida. Nós éramos o Dworkin emprestado e deixado na prateleira. 

Eu cantava Racionais para você e explicava todas as linhas. Mostrava minha indignação com o mundo e me contradizia em alguns discursos. Você, pacientemente, me corrigia. Me cantava Chico e dizia que "cada paralelepípedo da velha cidade esta noite vai se arrepiar…". Me mostrava seus Rocks e ouvia meus Raps – até os eventuais sertanejos que me acometiam em dias ensolarados. Você sabia todas as marchinhas de carnaval e foi assim, sa-sa-saricando, que eu vivi o meu carnaval, totalmente colombina, em seus braços. Com muito Aperol Spritz e Jack Daniels Honey. 

Nós éramos tudo isso e foi na frente da Marcela, ou Gabriela, eu não me lembro… Coisas que eu dizia no automático – o ar está bom? Sim. Água com gás? Sim. Quer que eu mude o canal? Não, pode deixar no futebol. Mais alguma coisa? Um Cohiba e uma Gin Tônica, disse, automaticamente. Caramba, Marcela, eu nem gosto de Gin. Agora já foi. Marcela virou e foi embora, com os pedidos em mãos. O ar me faltou por um momento. Eu senti que havia perdido algo. A esperança na vida? Não… A confiança, talvez. No amor. E precisei da Marcela (ou Gabriela) para me mostrar que você não estava mais no banheiro enquanto eu fazia seu pedido. Você não iria voltar e sentar ao meu lado com a camisa rosa da Juve e rir ao saber que eu já tinha feito seu pedido. 

O Gin veio e eu segui. Com Gin e tudo. Enxuguei os olhos, assistindo à goleada em cima do Barça e bicando no Gin.