Toca, despertador

Manter-se bem informada no Brasil está custando caro. Eu sempre defendi que a Globo News servia como uma farmácia sem receita, onde você ligava a televisão quando estava desgostosa com a vida e via que existiam pessoas com problemas maiores e piores que o seu. Mas, agora, essa prática caiu por terra. O problema é todo nosso. Nunca fomos tão tristes. UTIs atingindo lotação máxima, falta de gente treinada para atender nas unidades intensivas, gente negando que o vírus existe, máscaras, álcool em gel, mais máscaras, número de óbitos crescendo, 54 dias sem Ministro da Saúde.

Eu estou há muitos dias sem ver pessoas que eu amo por conta do Corona. Inclusive, meu pai. Acho isso tudo muito injusto. Estamos com nossa ansiedade lá em cima, a solidão batendo forte, o pânico aflorando em todo mundo. É esse o momento em que mais precisamos de abraços e beijos sinceros. Abraços daqueles fortes e intermináveis. Beijos demorados. A gente precisava mesmo é de contato.

O papo vai além. Todo mundo entende a necessidade do distanciamento. Compreendemos as máscaras tapando as bocas. Mas, justo agora? Eu queria ver todos os sorrisos do mundo. Queria aproximação social. Que parasse de morrer gente. Que o jornal não noticiasse números que não param de crescer.

Hoje eu zerei meu Instagram. É sério, eu simplesmente consegui ver todas as histórias, de todo mundo. E todas as publicações recentes. Aí, no Facebook, sempre as mesmas publicações que eu já tinha visto antes – porque fiquei atualizando muito. Queria ter a força de abandonar o celular. Eu não aguento mais o mundo virtual.

Saudade de cumprimentar o porteiro da faculdade, que sabia minha matrícula de cabeça porque eu esquecia o cartão todos os dias. Saudade de pedir um misto quente com pão francês da cantina do sétimo andar. De reclamar do trânsito parado. De poder sair sem máscara e sorrir para um desconhecido. De poder comprar um vinho no posto da esquina de casa. De cantar “Vai Passar”, do Chico, pensando só na letra e não na circunstância real. Saudade de apertos de mão que passam segurança. De sentar na Prestinaria e comer bolo tomando cafezinho gourmet. De levar minha filha no parque. De não estar tão amiga dos ansiolíticos. De não acordar, de madrugada, com a angústia de estar vivendo dentro de um filme, onde morre gente em massa e contamos com um governo omisso.

É como se fosse tocar um despertador, a qualquer momento, e nos acordar desse momento tão complicado e pesado.

A leveza – precisamos dela para viver. Ela e nada mais. Leveza.